Historicamente, a legislação penal tem servido para controlar a população pobre e negra.
Com o argumento de que o atual Código Penal precisa de reforma, um grupo de juristas elaborou uma série de textos que visam mudar a lei sem, contudo, acabar com o encarceramento em massa de negros, que é um dos maiores problemas da legislação penal.
O anteprojeto mantém todas as penalidades que visam controlar o povo pobre e negro, especialmente nos crimes contra o patrimônio.
Ele mantém como crime as condutas de furto e a apropriação indébita, por exemplo, práticas que dispensam o uso da violência contra a pessoa e que por isso deveriam sair do Código Penal, mantendo sua ilicitude apenas no âmbito cível.
Especialmente neste caso, o anteprojeto prevê a possibilidade de extinção da punibilidade nos casos de “restituição do patrimônio lesado”, condicionando-a, contudo, à aceitação da vítima.
Em último caso, se coloca na legislação a velha prática de cobrança feita em Delegacia ou por agentes policiais, o que representa um grave desvio de conduta, hoje praticado em grande escala à margem da lei e com a ação da polícia praticamente para fins particulares.
A proposta prevê o aumento das penas dos crimes contra o patrimônio privado, como no caso do crime de dano, cuja pena passaria a ser de seis meses a um ano (quando no Código atual a pena máxima é de seis meses) e mesmo do crime de furto que ganha novas qualificadoras como quando o crime é praticado contra “veículos automotores com a finalidade de enviá-los para o exterior ou outro estado”, ou “com uso de explosivos causando perigo comum”, ambas hipóteses casuístas, voltadas à proteção de patrimônio específico, no primeiro caso, e de titular específico - os bancos e seus caixas eletrônicos, no segundo caso.
O advogado André Luiz Moreira (OAB/ES) afirma que “enquanto isso, na contramão desse aumento de pena para os crimes contra o patrimônio; reduz as penas dos crimes contra o Sistema Financeiro, sob alegação de desproporção daqueles que são previstos na atual legislação”.
Ou seja, a reforma busca acalmar os empresários, banqueiros, e blindar a propriedade privada. E para tanto mantém ou mesmo amplia o encarceramento em massa de negros e pobres que existe no Brasil.
Para fazer demagogia com o povo negro, a comissão propõe a inclusão do crime de racismo no Código Penal. Crime que já é previsto em legislação específica.
A ineficiência da legislação contra o racismo data desde o início do século XX, quando da edição das primeiras leis que visavam punir o racismo.
Chegando até a Constituição Federal, a proibição do racismo possui um grande arcabouço legal e, de fato, não necessitaria de mais uma citação no Código Penal. E, na verdade, não passa disso, citação. Isso porque a ocorrência do racismo não sofre nenhuma redução com as legislações punitivas.
Isso se dá, especialmente, porque a aplicação da legislação é feita justamente pelo sistema penal. E este está diretamente comprometido com o encarceramento em massa dos negros; daí que vem a ineficiência das leis que punem o racismo.
Assim, o movimento negro não deve lutar pelo aumento de penas e criação de novos tipos penais sob o risco de ser ele mesmo o alvo das reformas e proibições.
Em último caso, não se deve lutar pelo fortalecimento do estado, especialmente no quesito punição, tendo em vista que é uma máquina de encarceramento da negritude e da população pobre.
(Fonte: http://www.pco.org.br/conoticias/ler_materia.php?mat=38810 - http://www.pco.org.br/biblioteca/negro/indice.htm )