@ Márcio Metzker
A matança de 59 pessoas que assistiam a um showde
música country em Las Vegas é mais um triste capítulo na escalada de
violência estúpida dos atiradores suicidas dos Estados Unidos. Stephen Paddock,
de 64 anos, bateu o recorde anterior, do louco assassino Omar Mateen, que havia
executado metodicamente 50 pessoas numa boate gay de Orlando, na
Flórida. Antes dele, uma chacina de grande repercussão perpetrada em 1999 por
dois estudantes na escola de Columbine, no Colorado, havia vitimado 12 alunos e
um professor, além dos outros 24 que foram baleados.
São óbvios os paralelos entre esses atos e os filmes de ação
em que os protagonistas matam cada vez mais adversários a cada título que entra
em cartaz. Assim como as pessoas comuns se apaixonam por astros e estrelas de
beleza irresistível e admiram os carros esportivos, os assassinos em potencial
ficam fascinados por armas mais leves, mas potentes e precisas. A indústria
armamentista cede novidades aos produtores desses filmes, com o objetivo de
criar desejo entre os traficantes e bandidos em geral.
Os Estados Unidos, país do bang-bang, é a pátria ideal
para esse tipo de assassinos em série que não têm motivos pessoais para
disparar contra inocentes. A banalização da morte coletiva precisa apenas de
uma mente doentia, um planejamento minucioso e armas e munições que podem ser
compradas e transportadas sem grande controle por parte das autoridades. Mas
também surge de cultos religiosos esquizofrênicos, como o do pastor Jim Jones,
que vitimou 918 pessoas por suicídio-assassinato em massa na Guiana, no ano de
1978, e do massacre de Waco, no Texas, em 1993, onde 73 seguidores do pastor
David Koresh morreram queimados, além dos que foram baleados pela polícia.
Por outro lado, motivações políticas também inspiram
atentados como o terrível ataque às torres gêmeas, em 2001, que deixou 3 mil
mortos, e o tiroteio que matou 180 pessoas no Teatro Bataclan e outros pontos
de Paris há dois anos, em Paris, reivindicado pelos terroristas do Estado
Islâmico.
Atos de pura atrocidade como esses horrorizam as pessoas
pela rapidez e pela eloquência das imagens que são distribuídas. São tratados
como um sinal do fim dos tempos por místicos e líderes religiosos, mas se
colocados numa perspectiva histórica perdem a significância. A própria Igreja
foi responsável por massacres aterrorizantes, como os milhares de mortes pela
fogueira ordenadas pela “Santa” Inquisição, e antes dela por quase um milhão de
mortes causadas durante as Cruzadas, campanhas de conquista desfechadas sob o
pretexto de libertar Jerusalém. Ninguém se esqueça de que os portugueses e
espanhóis mataram 150 milhões de índios americanos nos séculos 16 e 17. E os
mataram com lanças, machados e espadas, de maneira mais selvagem e sangrenta do
que os disparos de arma de fogo dos pioneiros e dos soldados que “limparam” o
Velho Oeste, exterminando quase completamente as tribos norte-americanas.
Crueldades inomináveis foram praticadas pelos conquistadores
orientais, como Gengis-Khan, e por imperadores romanos, como Calígula. Os
nacionalistas do Kuomintang chinês também derramaram muito sangue em lutas
fratricidas, mas não causaram tantas mortes como a fome nos primeiros anos do
regime de Mao-Tse-Tung. Os chineses deixaram de plantar arroz e trigo por
estarem empenhados em superar a produção siderúrgica da Rússia. Hitler foi o
responsável por 60 milhões de mortes na Segunda Guerra, mas pessoalmente
ordenou “apenas” o extermínio de 6 milhões de judeus. Stálin promoveu a morte
de milhões de seus compatriotas na Sibéria e nos gulags.
Como se vê, na perspectiva histórica Paddock não passa de um
micróbio se comparado aos monstros que cometeram iniquidades contra seus
semelhantes. Quem quiser superar seu feito, no entanto, terá que conseguir
disparar um artefato nuclear numa cidade populosa do Primeiro Mundo.